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Voto de Fux defende Bolsonaro e abre caminho para ingerência dos Estados Unidos no Brasil

Depois de 11 horas de leitura enfadonha do voto, o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Luiz Fux absolveu o réu Jair Bolsonaro.Não obstante estar gastando tempo e paciência de seus pares e de todos nós que queremos ver o desfecho do julgamento, várias pessoas já tentaram escrever análises das teses apresentadas pelo ministro.

Com todo o respeito a colegas jornalistas e juristas empenhados nessa hercúlea tarefa, sou obrigado a dizer que o voto de Fux, ainda em andamento, já mostrou com tantas evidências quanto as provas dos autos que não pode ser levado a sério do ponto de vista jurídico.

Buscar fundamentos de filosofia do direito, princípios, correntes de pensamento, juspositivismo, jusnaturalismo, anarquismo judicial ou o que mais nos ocorra pensar ou inventar para explicar seu raciocínio verborrágico é como tentar convencer um terraplanista de que a Terra é redonda. Nunca teremos argumentos suficientes.

Discurso serve à narrativa de extrema direita

Entretanto, se do ponto de vista do Direito o voto não faz o menor sentido, ele faz todo o sentido como munição para a cruzada do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump e dos filhos do ex-presidente para impedir sua prisão e, se possível, elegê-lo presidente no ano que vem.

A munição, no tipo de guerra travada por eles, não precisa de lógica, de teorias científicas ou de debates acadêmicos. Aliás, quanto mais distante estiver dessa seara, melhor para os objetivos dos senhores dessa guerra.

Quase todas as citações disfarçadas de aporte teórico são de autores ou fontes estadunidenses, o que, por si só, não representa nenhum demérito. Há nos Estados Unidos, como em todas as culturas, representantes que dignificam a espécie humana, e cito como exemplo Noam Chomsky, dentre inúmeros intelectuais, artistas, escritores, poetas.

No entanto, as referências apresentadas por Fux são justamente aquelas que envergonham a espécie, vendendo ou alugando seus cérebros no papel que Karl Marx chamou de intelectuais orgânicos da classe dominante, trabalhando a soldo desta para justificar a dominação de classe.

Em algum ponto do voto-ladainha, Fux deu-se a falar de democracia e leu quase a íntegra de um estudo publicado pelo The Economist, jornal representante do capital financeiro mundial e defensor de primeira hora do modelo neoliberal.

O tal estudo era uma espécie de “democraciômetro” que, a partir de critérios por eles estabelecidos, classifica as nações numa escala que vai de Democracia Plena, numa ponta, a Ditadura, na outra.

Segundo a tal classificação feita pelo mercado financeiro, o Brasil ocupa uma das piores posições. Segundo Fux, o “estudo”, que ele considera de alto valor, aponta a Venezuela no último lugar. Ele não diz quem está no topo das democracias, mas é de se supor que sejam os Estados Unidos, obviamente.

Plano golpista segue em curso no Congresso

Antes que as pessoas razoavelmente informadas comecem a rir compulsivamente, chamo atenção para o que apontei no início: a que serve esse voto?

Ele obviamente não vai mudar o resultado do julgamento e será devidamente destruído no momento do julgamento em que se abrirem os debates.

Fux vai tentar ganhar tempo para a continuidade do plano golpista que continua em andamento no Congresso com o PL da anistia, com as ações de traição e sabotagem econômica de Eduardo Bolsonaro nos Estados Unidos e com o seguimento da máquina de fake news, que permanece intacta.

O voto de Fux reproduz na íntegra, em todos os tópicos detalhadamente abordados, descritos e analisados, o discurso de extrema direita de Trump e dos bolsonaristas.

Fake news e manipulação nas redes sociais

Toda a ladainha tem endereço certo, já apontado por Moraes na construção golpista. O relator demonstrou, com fartura de provas correlacionadas a fatos públicos e notórios, como Bolsonaro tratava de criar factoides nas lives, aparições no cercadinho, discursos em atos, postagens em redes sociais.

Esses materiais serviam de matéria-prima para construir a narrativa de fraude eleitoral, manipulação de urnas, corrupção de ministros do STF e do TSE, criando uma zona nebulosa de realidade que impulsionou os acampamentos nos quartéis e o próprio 8 de janeiro.

Moraes mostrou uma dessas falas em que Bolsonaro dizia: “eu não vou dizer que [o ministro Edson] Fachin recebeu 30 mil dólares, não vou dizer que Alexandre Moraes recebeu 50 mil dólares”. Não vai dizer, mas disse.

Tais meias-palavras viravam verdade nas fábricas de fake news, massificadas por robôs e, logo em seguida, na boca de comentaristas da Jovem Pan e outros veículos a soldo da organização criminosa. Todo esse mecanismo é descrito de forma extremamente verossímil no voto de Moraes.

Voto busca deslegitimar o STF e adiar decisão

O voto de Fux se presta a fornecer farto material para produção de fake news e falsos argumentos para os comentaristas e colunistas adestrados da extrema-direita.

Se presta também a corroborar os argumentos de Trump quando o presidente dos Estados Unidos ataca as instituições democráticas brasileiras e ameaça nossa soberania — não pela pessoa de Bolsonaro (poderia ser qualquer um), mas para seu projeto declarado de recolonizar a América Latina.

O voto de Fux tem por objetivo fornecer argumentos para desacreditar o STF, fazendo-o parecer uma corte viciada e autoritária que persegue adversários políticos quando estes o denunciam como tal.

É exatamente o discurso trumpista, que busca justificativa para intervenções como as sanções econômicas em vigor contra o país e contra autoridades da República.

A leitura na íntegra de um voto extremamente longo visa atrasar o julgamento de modo que chegue o recesso do Judiciário, que começa em 20 de dezembro, e jogar o resultado e o julgamento de embargos já garantidos pela simples divergência de Fux, acatando a preliminar de incompetência do STF.

Então, caros colegas jornalistas, caros juristas chamados a opinar, colunistas adestrados ou não, não percam seu tempo procurando explicar o voto através de argumentos jurídicos.

Olhem mais fundo e ajudem a denunciar essa verdadeira traição ao país que está sendo perpetrada por um deputado federal, filho do ex-presidente, e agora ajudado por um ministro da Suprema Corte brasileira.

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