A mais recente proposta do presidente norte-americano Donald Trump sobre Gaza reacendeu o debate em torno do futuro da causa palestina como um todo. A proposta veio carregada de promessas humanitárias urgentes, mas, ao mesmo tempo, envolta em ambiguidades políticas que podem ter repercussões de longo alcance.
O plano coloca sobre a mesa uma série de medidas difíceis de se rejeitar à primeira vista: cessar-fogo, retirada gradual das forças israelenses, entrada de ajuda humanitária incondicional no território e troca de prisioneiros.
No entanto, o verdadeiro problema está no que vai além desses títulos: a indefinição sobre os limites da retirada e a possibilidade de se consolidar a separação de Gaza da Cisjordânia, o que pode minar os fundamentos do Estado palestino reconhecido internacionalmente nas fronteiras de 1967.
Diante disso, revela-se urgente uma abordagem palestina abrangente, que vá além dos cálculos faccionais estreitos. A questão não diz respeito apenas a Gaza, mas relaciona-se diretamente ao futuro de Jerusalém e da Cisjordânia, bem como ao direito do povo palestino de decidir seu destino e estabelecer seu Estado independente.
Missão humanitária da flotilha para Gaza desafia Israel com apoio de 16 países, incluindo o Brasil
Daí a necessidade de convocar um amplo diálogo nacional que reúna os secretários-gerais das facções, o Comitê Executivo da Organização para a Libertação da Palestina (OLP) e personalidades nacionais consensuais, a fim de formular uma posição unificada diante do plano de Trump e formar uma equipe de negociação em nome da OLP, reconhecida como o único e legítimo representante do povo palestino.
A alternativa apresentada pelos palestinos baseia-se em um conjunto de princípios: cessar-fogo imediato, retirada completa de Israel da Faixa de Gaza, entrada incondicional de ajuda humanitária, troca de prisioneiros, criação de um comitê nacional para administrar Gaza sob a referência da OLP e lançamento de um plano de reconstrução sob a tutela egípcia e árabe.
Além disso, a realização de eleições democráticas gerais sob o sistema de representação proporcional plena permanece como um instrumento essencial para renovar a legitimidade nacional e fortalecer a unidade interna.
A posição árabe em relação à proposta norte-americana mostrou-se cautelosa: as declarações de boas-vindas enfatizaram os aspectos humanitários, mas vincularam o futuro da Faixa de Gaza ao Estado palestino independente – uma formulação política intencional para evitar confronto direto com Washington e, ao mesmo tempo, manter aberta a possibilidade de ajustes que restituam centralidade aos direitos nacionais palestinos.
Assine nossa newsletter e receba este e outros conteúdos direto no seu e-mail.
Em última análise, o debate sobre o plano de Trump vai além da trégua e da ajuda humanitária. Em essência, trata-se de um novo teste à capacidade dos palestinos de formular uma posição unificada que preserve a unidade da terra e do povo e evite a consolidação de um cenário de separação.
Lidar com este momento com cautela e responsabilidade pode transformá-lo de uma armadilha política em uma oportunidade de reconstruir o consenso nacional com base no direito à autodeterminação e na criação de um Estado palestino independente.
Edição de Texto: Alexandre Rocha
As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul Global.

