A poucos dias das eleições gerais de 16 de novembro no Chile, os candidatos da direita atiçam discursos de ódio, xenofobia, insegurança e medo da delinquência, assim como o negacionismo dos crimes de lesa-humanidade cometidos pela ditadura cívico-militar (1973/1990).
Sondagens de intenção de voto publicadas pelo site Radar Eleitoral dão à oficialista Jeannette Jara, do Partido Comunista, 28,5 pontos. Enquanto isso, disputam o segundo lugar — que pode levar ao eventual segundo turno em dezembro — José Antonio Kast, do Partido Republicano, com 19,9 pontos; Johannes Kaiser, do Partido Nacional Libertário, com 15,6; e Evelyn Matthei, da União Democrata Independente, com 14,1%.
Kaiser é ferrenho defensor do golpe de Estado de Augusto Pinochet (1973-1990) e das atrocidades cometidas durante os 17 anos seguintes. Ele atacou o Serviço Médico Legal (SML), responsável pelas perícias forenses, acusando-o de postergar deliberadamente “milhares de protocolos de identificação de detidos desaparecidos sem processar”. A intenção do órgão, segundo o pinochetista, seria manter o tema aberto, em “mais uma mostra de como está podre o sistema de direitos humanos no Chile”. Além disso, qualificou como “uma fraude” o plano nacional de buscas promovido pelo governo.
O SML desmentiu as acusações e assegurou que “todo o material e evidência foi analisado ou se encontra em processo de análise”.
Nesta semana, em um debate de rádio, Kaiser propôs indultar militares e civis condenados por crimes de Estado, incluindo o brigadeiro Miguel Krassnoff, sentenciado a mais de mil anos de prisão.
“Vou encerrar o capítulo 1973/1990 para todos. Não se pode ter pessoas de 80 e 90 anos apodrecendo na prisão, querendo misturá-las com delinquentes comuns apenas porque são mal vistas por alguns”, disse.
“Os direitos humanos só interessam quando afetam um setor e não outros; o fato é que o Estado é obrigado a respeitar os direitos humanos de todas as pessoas, inclusive dos prisioneiros sob sua custódia, muitos dos quais foram condenados injustamente”, continuou.
“Deveríamos encerrar de uma vez por todas o capítulo 73-90. Muitas pessoas foram condenadas a penas muito mais longas do que as que normalmente se aplicam a alguém que cometeu um delito equivalente”, argumentou.
O espetáculo de Kast
Segundo as pesquisas, Kaiser avançou rapidamente nas preferências nas últimas semanas e poderia chegar ao segundo turno de dezembro, superando Kast, que na quinta-feira (6), em um ato proselitista, se cercou de um aparato de segurança que incluía vidros blindados — algo inédito no país.
Kast justificou o aumento da segurança com o argumento de que, se vencer, supostamente liderará um ataque frontal contra a delinquência e os migrantes irregulares. Portanto, já seria um alvo potencial e precisaria se proteger.

Em entrevista coletiva, o republicano disse: “Faltam 133 dias para que um novo governo assuma; é o tempo que possuem (os 330 mil migrantes irregulares) para partir e deixar nossa pátria. Se não o fizerem voluntariamente, vamos buscá-los, e haverá sanções.”
Disse ainda que, nos Estados Unidos de Donald Trump, “a detenção de 500 mil pessoas fez com que 1,5 milhão deixasse voluntariamente o país”.
“Para cada pessoa que tivermos de ir buscar, esperamos que antes tenham saído pelo menos cinco”, acrescentou.
Também retomou seu discurso religioso fundamentalista e afirmou que a esquerda “quis mudar” o “hino” e a “fé” no Chile. “Esses princípios, essa cruz que levamos no coração, vamos defendê-los — faremos isso com esperança, temperança e coragem. Vamos voltar a falar de Deus, da pátria e da família”, acrescentou.
Projeto de longo prazo
Segundo o diretor do Centro Democracia e Opinião Pública da Universidade Central, Marco Moreno, o discurso ultradireitista de Kaiser busca “influenciar o voto antissistema, provocando um voto de raiva contra a elite e os partidos tradicionais”.
Nesse contexto, acrescentou que a estratégia de Kaiser não é necessariamente vencer esta eleição, mas sim fazer uma “investimento político de longo prazo”, porque “suas chances de chegar ao segundo turno ainda são baixas”.
“Está pavimentando um projeto político para quatro anos, no qual se converterá na principal figura da direita dura, diante do vazio que provavelmente Kast deixará”, concluiu.
La Jornada, especial para Diálogos do Sul Global – Direitos reservados.

