“Na atual situação complexa, nesta hora de desafios, mais do que nunca estamos lado a lado com nossos aliados da Venezuela”, afirmou em 20 de novembro o vice-chanceler russo, Serguei Ryabkov, durante críticas às “acusações infundadas” que Washington lança contra Caracas.
“A região do Caribe está se convertendo em zona de outro conflito potencial sob um pretexto inventado. É óbvio que o combate ao narcotráfico deve ser feito por outros meios e também é evidente que as acusações para justificar a escalada militar dos Estados Unidos contra o governo bolivariano e contra a Venezuela como país carecem, na realidade, de fundamento”, acrescentou Ryabkov em um adiantamento da entrevista que concedeu à revista Mezhdunaródnaya Zhizn (Vida Internacional), editada pelo Ministério das Relações Exteriores da Rússia.
O diplomata sustentou que a Venezuela “não está, nem de longe, na vanguarda do narcotráfico, como se pode ver nos documentos sobre o tema publicados em anos recentes tanto nos Estados Unidos como na Organização das Nações Unidas (ONU)”.
E seguiu: “Exagera-se a importância dos cartéis de drogas que Washington tanto menciona apenas para preparar o terreno político com o propósito de acumular força militar diante das costas da Venezuela. E isso nos preocupa”, sublinhou.
O encarregado das relações russas com a América Latina e o Caribe — e de outras áreas de responsabilidade na equipe do ministro das Relações Exteriores da Rússia, Serguei Lavrov — reiterou que a Rússia condena o aumento da tensão na região. “Nos pronunciamos a favor de que toda a América Latina siga sendo uma zona de paz”, ressaltou.
Ryabkov recordou que a Rússia tem uma aliança especial com a Venezuela. “Há pouco ratificamos o acordo básico sobre uma associação estratégica com esse país. Cooperamos em todos os âmbitos; nossas forças de segurança interagem e isso não é nenhum segredo”, assinalou.
Rússia condena operação “Lança do Sul”
Em 14 de novembro, foi a vez do porta-voz Dmitri Peskov comentar a questão. Segundo ele, o Kremlin espera que os Estados Unidos não utilizem a operação militar Southern Spear (Lança do Sul), anunciada em 13 de novembro, contra o narcotráfico, como pretexto para “desestabilizar a situação em torno da Venezuela e do Caribe”.
O secretário de imprensa da presidência russa lamentou que “o direito internacional se encontre em um estado lamentável em muitos lugares”, em alusão às ameaças estadunidenses contra países do Caribe.
Outra figura proeminente do Kremlin a denunciar a ofensiva de Washington foi a porta-voz do Ministério das Relações Exteriores, Maria Zajarova: “A Rússia compartilha a preocupação expressa pelos governos de nossos amigos Venezuela e Colômbia”.
Zajarova lembrou que o combate ao tráfico ilegal de drogas “não deve ser usado como meio de pressão contra Estados soberanos”, e reiterou: “Nos pronunciamos categoricamente contra o uso da força ou das ameaças de ingerência externa em seus assuntos internos [da Venezuela] mediante toda sorte de pretextos, incluída a luta contra o narcotráfico.”

Zajarova acrescentou: “Partimos do princípio de que, para deter o tráfico de drogas, inclusive nos Estados Unidos, antes de tudo é necessário consolidar os esforços tanto regionais como internacionais”. A solução efetiva dos problemas, afirmou, “só pode ser alcançada com ações globais e com mecanismos internacionais legais.”
Ainda na opinião da diplomata, “isso não é possível sem pôr fim às pressões exercidas pelo Pentágono, que ultrapassam em muito os parâmetros dos objetivos proclamados pelo governo estadunidense, incrementando suas ameaças contra a estabilidade regional e a soberania da República Bolivariana da Venezuela”.
A funcionária do Ministério das Relações Exteriores da Rússia, por fim, expressou a esperança de que a comunidade internacional saiba condenar essa política (dos Estados Unidos) “para prevenir cenários catastróficos, que não só colocariam em risco a paz e a estabilidade na região, mas também teriam um impacto negativo no sistema internacional de controle legal de drogas”.
As críticas de Lavrov
Já em 11 de novembro, o próprio chanceler Serguei Lavrov reiterou o rechaço da Rússia às ações que os Estados Unidos empreendem contra a Venezuela, denunciando: “Sob o pretexto de combater o narcotráfico, destroem lanchas de maneira arbitrária e sem apresentar a ninguém nenhuma evidência de que, como dizem, transportavam drogas”. E acrescentou: “Assim se comportam não os países que respeitam a lei, mas os que se consideram acima dela.”
O titular da diplomacia russa — que naquele data ofereceu por videoconferência uma coletiva de imprensa a meios russos — recomendou aos Estados Unidos que, “em vez de combaterem o narcotráfico na Nigéria ou na Venezuela e, de passagem, tentarem ficar com seu petróleo, dediquem melhor todos os seus esforços para erradicar essa chaga na… Bélgica”. Ele lembrou que, recentemente, o Daily Mail publicou uma reportagem sobre a corrupção na aduana belga que, na avaliação do diário britânico, está convertendo a Bélgica em um narcoestado.
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Por isso, acrescentou, é mais lógico atuarem na Bélgica. “Ainda mais porque lá há tropas dos Estados Unidos e de outros países da Otan. Não é preciso perseguir lanchas com três pessoas a bordo”, ironizou.
“Estou convencido de que a política da administração de Donald Trump para com a Venezuela nada de bom vai trazer, nem aumentará o prestígio estadunidense no âmbito internacional”, prognosticou o chanceler russo.
Lavrov também negou que a Venezuela tenha pedido ajuda militar à Rússia diante da escalada das ameaças dos Estados Unidos — como alegaram veículos internacionais com base em fontes anônimas — e muito menos que o Kremlin vá instalar armas no país latino-americano como está fazendo na Bielorrússia.
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“Não, não recebemos nenhuma solicitação a esse respeito”, respondeu Lavrov. “Não é correto comparar, por um lado, nossa relação com a Bielorrússia — que faz parte do Estado da União (espécie de confederação em formação entre Moscou e Minsk), com a qual temos posições sincronizadas, coordenadas, únicas em todos os assuntos-chave da segurança internacional — e, por outro, nossas relações com a Venezuela — um país amigo, que é nosso parceiro estratégico, o que ficou selado com a assinatura recente de um Tratado”.
Lavrov recordou que o referido documento russo-venezuelano, assinado em maio passado, ainda se encontra em fase de ratificação – falta cumprir algumas formalidades nas duas câmaras do Parlamento russo para que o presidente Vladimir Putin o promulgue. “A Rússia está pronta para cumprir plenamente as obrigações que acordamos de modo recíproco com nossos amigos venezuelanos”, concluiu.
Declaração da Duma
Ainda em 11 de novembro, os deputados da Duma, a Câmara Baixa do Parlamento russo, aprovaram uma declaração condenando a presença militar dos Estados Unidos perto das costas da Venezuela.
Os legisladores exortam a comunidade internacional “a condenar com firmeza o reforço da presença militar dos Estados Unidos na parte sul do mar do Caribe, junto às águas territoriais da Venezuela, com a desculpa de combater o narcotráfico”.
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Os deputados “se opõem às ações agressivas e provocadoras de Washington” em relação à Venezuela, “um Estado soberano”, o que “contraria os princípios e as normas do direito internacional universalmente aceitos”.
O documento denuncia as “tentativas de impor desde o exterior um governo fantoche” e sustenta que “os cidadãos da Venezuela fizeram sua escolha em favor da independência e defendem sua soberania”.
A administração estadunidense, avaliam os deputados russos, “deve se abster de uma escalada e contribuir para a busca de soluções para o problema do crime organizado e do narcotráfico transfronteiriço mediante a cooperação e o diálogo com outros governos”.
Após expressar um “firme apoio e solidariedade com o governo da Venezuela”, a Duma insta a comunidade internacional a “condenar de maneira imediata e incondicional as ameaças do uso da força e sua aplicação contra a Venezuela”, ao mesmo tempo que defende manter a região como “zona de paz, estabilidade e cooperação”.
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