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Coca-cola, futebol, traição: como Trump tenta ofuscar seus laços com Jeffrey Epstein

O homem no posto mais poderoso do mundo, que guia a maior superpotência em guerras, genocídios, disputas comerciais e possíveis crises econômicas e sociais causadas por suas próprias políticas – para não falar da alarmante evidência das mudanças climáticas, que ele continua negando – está concentrado na receita da Coca-Cola, em recuperar um nome racista para um time de futebol americano, em acusar de “traição” ex-presidentes e em festejar a demissão de um comediante.

Alguns observadores acreditam que se ocupar com esses assuntos secundários tem outro objetivo: distrair o público do crescente escândalo sobre sua amizade com o falecido Jeffrey Epstein, próximo de ricos e famosos, acusado de tráfico sexual e pedofilia. Tão sério é o problema político que, na terça-feira passada (22), o presidente da Câmara dos Representantes, o republicano Mike Johnson, anunciou que adiantaria para 23 de julho o início do recesso de cinco semanas da Casa Legislativa, a fim de evitar que o tema dessa relação fosse discutido no plenário; também acusaram os democratas de usar o caso como parte de um “jogo político”.

Epstein, que supostamente se suicidou em sua cela em Nova York em 2019 enquanto aguardava julgamento por tráfico sexual de menores, mantinha amizade com vários integrantes das elites políticas e empresariais, incluindo o príncipe Andrew, da Inglaterra, Bill Clinton e Trump, entre muitos outros. As bases de Trump acreditam que Epstein foi assassinado justamente para que não fosse revelada uma “lista de clientes” composta por democratas de destaque – versão que o próprio Trump alimentou no passado. Há, no entanto, vídeos e declarações de Epstein e Trump sobre sua grande amizade e sua preferência por mulheres atraentes, incluindo algumas “muito jovens”. Trump prometeu tornar pública essa lista e outros documentos relacionados ao caso quando chegou à Casa Branca, e sua procuradora afirmou que estava avaliando a “lista”, que estaria sobre sua mesa.

Em 2023, Trump, então empresário, enviou uma carta pelo 50º aniversário de seu amigo Epstein, com várias insinuações sobre seus interesses mútuos em mulheres (Imagem gerada por IA – Créditos: Mike Goad / Flickr)

Mas, de repente, a Casa Branca e o Departamento de Justiça indicaram neste mês que o caso está encerrado e que a lista não necessariamente existe, o que provocou uma onda de ira e descontentamento entre as bases mais fiéis do presidente e alguns de seus aliados mais próximos. Trump declarou que o assunto está encerrado e que é algo “chato” e “sem importância”.

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Cúmplice de Epstein em rede de tráfico

O Wall Street Journal alimentou a controvérsia em 17 de julho ao noticiar que, em 2023, Trump, então empresário, enviou uma carta pelo 50º aniversário de seu amigo Epstein, com várias insinuações sobre seus interesses mútuos em mulheres. Trump atacou o Journal e seu proprietário, o aliado direitista Rupert Murdoch, que também é dono da Fox News, e os processou em 10 bilhões de dólares por difamação. A Casa Branca também anunciou que, como castigo, o correspondente do Wall Street Journal será expulso do grupo de jornalistas que viajam com o presidente.

Em 22 de julho, o Departamento de Justiça informou que o subprocurador-geral Todd Blanche está buscando um encontro com Ghislaine Maxwell, ex-namorada de Epstein e cúmplice na organização dos serviços sexuais, que cumpre uma pena federal de 20 anos por participação no tráfico sexual de menores promovido pelo companheiro. Isso gerou especulações sobre a possibilidade de lhe ser oferecido algum tipo de indulto em troca de apoiar versões que ajudem a proteger o presidente.

Trump, continuando com seus esforços para distrair a atenção do caso Epstein, escreveu em sua rede social que o ex-presidente Barack Obama deveria ser investigado por “traição”, sem especificar do que o acusava, além de afirmar que o ex-presidente estava tentando levar a cabo um “golpe de Estado”. O escritório do democrata apenas comentou que a mensagem era uma “tentativa fraca de distração”.

Enquanto isso, a Casa Branca inundava o espaço público com proclamações sobre os grandes êxitos de Trump, como sempre, “históricos”, em seus primeiros seis meses de governo. Declarou que o republicano herdou “um país morto”, que conseguiu ressuscitar milagrosamente, e que agora os Estados Unidos são a nação “mais promissora e respeitada do mundo”. No entanto, a opinião pública não parece estar comemorando com seu líder.

Trump cai nas pesquisas

A aprovação do mandatário despencou 11 pontos desde fevereiro, ficando em apenas 42%, segundo a pesquisa mais recente da CBS News. Com base em levantamentos da Gallup, o USA Today concluiu que sua taxa de aprovação é a mais baixa entre todos os presidentes neste ponto de mandato. Uma média das principais pesquisas do país, calculada pelo The New York Times, confirma que hoje a maioria (53%) desaprova sua gestão.

Mas, enquanto a presidência e seus aliados se enredavam em sua própria armadilha sobre Epstein e rejeitavam como “fake news” toda crítica a suas façanhas, o mandatário marcou outro grande “triunfo” para sua presidência: obrigou a Coca-Cola a usar açúcar de cana em sua bebida emblemática. Em 22 de julho, q empresa confirmou que, a partir de setembro, oferecerá uma versão de seu refrigerante com açúcar de cana (desde a década de 1980 vinha utilizando xarope de milho).

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Em outro front, o presidente exigiu que o time profissional de futebol americano Washington Commanders voltasse a usar seu nome anterior: Redskins. Campanhas de organizações de direitos civis indígenas, que lutaram durante anos contra nomes e símbolos racistas em equipes esportivas, haviam conseguido que o nome fosse abandonado. Trump ameaçou tentar barrar a construção de um novo estádio caso não atendam à sua exigência.

O presidente também dedicou tempo a sua disputa com comediantes que figuram entre seus críticos mais contundentes – mas, ao contrário de outros alvos de seus ataques, estes não ficaram calados. Depois de comemorar que o apresentador do programa noturno The Late Show, Stephen Colbert, será demitido pela CBS quando seu contrato terminar, em maio de 2026, Trump advertiu que o próximo poderia ser Jimmy Kimmel, apresentador do programa noturno concorrente da ABC e outro crítico do presidente. Em 21 de julho, Colbert, no início de seu programa, dirigiu-se ao presidente: “Agora, sim, nós vamos tirar as luvas” – e, olhando diretamente para a câmera, respondeu à mensagem triunfal de Trump sobre sua demissão: “Vá à merda!” (go fuck yourself).

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Em um gesto de solidariedade, as câmeras registraram na plateia os apresentadores dos programas noturnos da NBC — ou seja, os outros concorrentes — Jimmy Fallon e Seth Meyers, além de seus famosos colegas da comédia satírica Jon Stewart e John Oliver, e estrelas como Adam Sandler, Lin-Manuel Miranda e o jornalista Anderson Cooper. Outras figuras conhecidas também se juntaram a uma onda de apoio e críticas (https://www.youtube.com/watch?v=VIZegLAvK8o&t=8s).

No mesmo dia, em seu programa The Daily Show, Stewart apresentou um coro no estilo gospel que, ao se referir ao presidente e indiretamente à CBS e à Paramount — também donas de seu canal, o Comedy Central —, cantou em uníssono: “Vá à merda!” (https://www.youtube.com/watch?v=TwOLo_U6bTw).

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