A medida anunciada por Lula em cadeia nacional, na noite de 30 de novembro, afirma o compromisso de aliviar quem vive do trabalho e enfrentar privilégios históricos num país marcado pela desigualdade
O pronunciamento do presidente Lula em cadeia nacional, na noite de domingo, 30 de novembro, marcou mais que a sanção de uma lei: marcou uma inflexão no debate público sobre justiça fiscal e sobre o sentido de se fazer política num país que convive, há séculos, com desigualdades gritantes. Em cinco minutos, Lula buscou falar diretamente ao trabalhador — aquele que sustenta o país, mas raramente é ouvido — para anunciar a isenção do Imposto de Renda para quem recebe até R$ 5 mil mensais, promessa antiga que finalmente ganha forma jurídica.
Não se trata apenas de um ajuste técnico na tabela do IR, mas de um recado político claro: quem carrega o Brasil nas costas não pode continuar pagando a conta mais pesada. Ao aliviar a taxação sobre a base da pirâmide, o governo desloca o debate para onde sempre deveria ter estado — o topo. A taxação sobre altas fortunas e grandes rendimentos é apresentada como condição para que a isenção seja possível. Em outras palavras: justiça fiscal não é mágica, é escolha. E o Estado brasileiro, pela primeira vez em muitos anos, escolhe aliviar os de baixo ao invés de blindar os de cima.
O presidente reforçou a ideia de que política se faz com sensibilidade social. E aqui está talvez o ponto mais relevante do discurso: a lembrança de que o Estado não existe para ser máquina de exclusão, mas instrumento de inclusão. Lula fala de dignidade como quem fala de pão. Fala de igualdade como quem fala de futuro. Num país cansado de cortes, austeridades e chantagens do mercado, o pronunciamento soa como respiro — ainda que limitado, ainda que contestado por setores que jamais aceitaram distribuir sequer um pouco de seus privilégios.
Há também dimensão simbólica. Num momento em que forças golpistas, negacionistas ou simplesmente predatórias tentam capturar o debate público, o governo opta por comunicar que justiça fiscal é parte da democracia. E que democracia, se não servir para melhorar a vida do trabalhador, não serve para nada. O gesto de isentar quem ganha até R$ 5 mil e reduzir a tributação para quem ganha até R$ 7.500 não resolve tudo, claro. Mas aponta um rumo: o de um país que tenta se reencontrar com a ideia de igualdade.
Entendemos que Lula recoloca no centro da cena a luta histórica por um sistema tributário progressivo e por um Estado que reconheça o valor social do trabalho. É um gesto político num momento de tensão institucional e disputa feroz de narrativas. E, por isso mesmo, merece ser analisado com cuidado. O Brasil tem sido laboratório de desigualdades extremas; talvez agora possa começar a ser laboratório de mudanças.
As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul Global.

