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Cannabrava | COP30 termina entre avanços tímidos e omissões graves

Declaração final ignora combustíveis fósseis, enquanto Marina Silva reafirma liderança brasileira e povos indígenas denunciam impasse estrutural

A COP30 chegou ao fim em Belém com o discurso emocionado da ministra Marina Silva e com uma declaração final que, embora traga alguns avanços, revela de forma clara os limites políticos que seguem travando a governança climática global. Marina reconheceu que o progresso foi modesto, mas destacou que representa o possível dentro das correlações de força atuais. Reafirmou o compromisso do Brasil em liderar duas “mapas do caminho”: um para deter e reverter o desmatamento e outro para orientar uma transição energética justa e equitativa. Sua fala, firme na defesa da Amazônia e na exigência de compromissos mais ousados, terminou sob aplausos de pé, sinal do peso político e simbólico da posição brasileira.

A declaração final, entretanto, expõe contradições profundas. O texto evita mencionar explicitamente os combustíveis fósseis — justamente o ponto central de qualquer pacto climático digno desse nome. A omissão não foi resultado do acaso: o lobby das grandes petroleiras, somado à resistência de países altamente dependentes da exportação de petróleo, pesou de maneira decisiva e bloqueou qualquer referência ao fim da exploração de petróleo, gás ou carvão. Essa lacuna é alarmante. Como falar em futuro sustentável sem enfrentar a raiz do problema?

Ainda assim, o documento incorpora alguns avanços. O acordo prevê triplicar, até 2035, os recursos destinados à adaptação climática — um gesto importante, embora insuficiente diante da dimensão da crise. Pela primeira vez, há um reconhecimento explícito da importância da participação de povos indígenas e populações afrodescendentes nas estratégias globais de enfrentamento climático, um ponto relevante sobretudo em uma conferência realizada no coração da Amazônia.

Esse reconhecimento, porém, contrasta com a leitura firme apresentada pelas lideranças dos povos da floresta, que reagiram com frustração ao texto final. Para essas lideranças, a COP voltou a evitar enfrentar as causas estruturais da crise: o extrativismo predatório, o avanço das fronteiras de destruição e a falta de vontade política para limitar o poder das petroleiras e do agronegócio. Não basta serem citados: é preciso garantir proteção aos territórios, respeito às formas de vida tradicionais e reconhecimento de seus sistemas de manejo como pilares indispensáveis de qualquer política climática séria.

No conjunto, a COP30 reafirma um padrão conhecido: avança-se na retórica, reiteram-se metas já consensuais, reforçam-se compromissos financeiros, mas trava-se justamente onde o futuro da humanidade está em jogo. Sem um plano claro e vinculante para abandonar os combustíveis fósseis, qualquer promessa corre o risco de se transformar em mero adorno diplomático. Nem mesmo a forte atuação brasileira — expressa no discurso contundente de Marina Silva e nos esforços para articular negociações complexas — foi suficiente para romper o bloqueio imposto pelos interesses econômicos mais poderosos do planeta.

Martelo usado pelo embaixador brasileiro André Corrêa do Lago, presidente da COP30, para selar os acordos debatidos durante a cúpula em Belém do Pará. (Foto: Ueslei Marcelino / COP30)

Assim, a COP30 termina com sinais mistos. Belém se firmou como centro do debate global, e o Brasil recuperou protagonismo climático. Mas a falta de coragem política para enfrentar o setor fóssil mantém o mundo preso a um modelo esgotado. Nesse impasse, decide-se não apenas a credibilidade das conferências climáticas: decide-se o destino das próximas gerações.

As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul Global.

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