Os governantes de Brasil, Espanha, Colômbia, Uruguai e Chile, protagonistas da Reunião de Alto Nível “Democracia Sempre”, realizada na nação chilena nesta segunda-feira (21), alertaram que “o mundo atravessa um período de profunda incerteza, no qual os valores democráticos são desafiados de forma permanente”.
Na declaração conjunta ao final da reunião, os líderes assinalaram que “é um imperativo ético e político impulsionar uma estratégia comum para enfrentar fenômenos globais como o crescimento da desigualdade, a desinformação e os desafios colocados pelas tecnologias digitais e pela inteligência artificial”.
Os líderes se comprometeram a “promover um multilateralismo renovado, mais eficaz, inclusivo e participativo, que respeito o direito internacional e incorpore a cidadania nas decisões”.
Também propuseram mudar a governança internacional, “particularmente da Organização das Nações Unidas, para recuperar sua capacidade de ação e legitimidade diante dos desafios globais”.
Igualmente, propuseram “fortalecer uma diplomacia democrática ativa, baseada na cooperação entre Estados que compartilham os valores da democracia, da justiça social, da soberania dos Estados e dos direitos humanos, como resposta ao desgaste das instituições”.
Os posicionamentos dos líderes
O espanhol Pedro Sánchez afirmou: “Nossas sociedades enfrentam uma ameaça liderada por uma coalizão entre oligarcas e a ultradireita, uma internacional do ódio e da mentira que avança pelo mundo arriscando direitos pelos quais muitas gerações chegaram a sacrificar sua vida”.
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Preservar e melhorar a democracia, acrescentou, “é um dever moral, uma responsabilidade que devemos às gerações passadas e às futuras”.
Para o Presidente Lula, “a democracia liberal não tem sido capaz de responder aos anseios e necessidades contemporâneos; o ritual eleitoral já não é suficiente. O sistema político e os partidos caíram em descrédito”.
Quando “o extremismo tenta reeditar práticas intervencionistas (afirmação em possível referência à imposição, por parte dos Estados Unidos, de tarifas de 50% às exportações brasileiras como punição pelo julgamento do ex-presidente golpista Jair Bolsonaro), defender a democracia não corresponde apenas aos governos. Requer a ação da academia, dos parlamentos, da sociedade civil, dos meios de comunicação e do setor privado”, alertou Lula.
Por sua vez, o colombiano Gustavo Petro disse que “o progressismo deve se unir em todo o mundo e acender a luz quando as trevas começam a amedrontar a alma”.

O uruguaio Yamandú Orsi pediu para “situar a proposta de democracia em questões que os povos sintam”, porque “se formos capazes de fazer autocrítica de por que a democracia perde credibilidade, por que não fazemos os esforços para evitar o crescimento dos extremos e a perda de confiança no diálogo (…) poderemos valorizar a igualdade e a liberdade”.
O anfitrião, Gabriel Boric, comentou: “Aqui está nascendo algo grande”, porque “farão parte deste grupo ampliado, aceitaram com muito entusiasmo e aguardam o encontro que faremos em um mês na Assembleia Geral das Nações Unidas” as presidentas do México, Claudia Sheinbaum; de Honduras, Xiomara Castro; da Dinamarca, Mette Frederiksen; os primeiros-ministros da Inglaterra, Keir Starmer; do Canadá, Mark Carney; da Austrália, Anthony Albanese; e o presidente da África do Sul, Cyril Ramaphosa.
Entre as iniciativas acordadas, destacam-se: consolidar uma rede de países e sociedade civil que impulsione a construção de uma democracia conectada com a cidadania, estabelecer uma rede de centros de pensamento que gerem análises e propostas em defesa da democracia, colaboração para a transparência algorítmica e a governança digital, promover uma tributação progressiva e a cooperação fiscal internacional e criar um observatório das juventudes frente ao extremismo.
Do mesmo modo, os mandatários exigiram um cessar-fogo em Gaza e “o acesso pleno, seguro e sem restrições de ajuda humanitária à faixa”.
“Democracia Sempre” dá continuidade a encontro de 2024
O Palácio de La Moneda, na capital chilena, foi o cenário escolhido para Reunião de Alto Nível “Democracia Sempre”, onde Boric recebeu seus homólogos do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva; da Espanha, Pedro Sánchez; do Uruguai, Yamandú Orsi; e da Colômbia, Gustavo Petro.
Segundo a convocatória oficial, o encontro teve como objetivo “avançar em um posicionamento compartilhado em favor do multilateralismo, da democracia e da cooperação global baseada na justiça social”, e deu continuidade à primeira reunião da iniciativa “Em defesa da democracia: combatendo o extremismo”, organizada em setembro 2024 pelos presidentes do Brasil e da Espanha.
Em Santiago, os governantes dialogaram sobre: fortalecimento da democracia e do multilateralismo; redução das desigualdades; combate à difusão de desinformação e regulação de tecnologias emergentes.
Pressões do empresariado do Chile
O encontro provocou temores e críticas em setores do empresariado e da direita local, que advertiram que o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, pode interpretá-lo como mais um desafio aos interesses e ao predomínio de Washington, e reagir com a imposição de novas tarifas aduaneiras.
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No caso chileno, já penalizado com uma sobretaxa de 50% às exportações de cobre, porta-vozes do empresariado insistiram que Boric não gerasse “nenhum tipo de desconfiança ou de temor frente às negociações” em curso.
A esse respeito, a porta-voz governamental, a ministra Camila Vallejo, assinalou: “Surpreende muito que se critique um espaço onde o que se busca é dialogar para fortalecer a democracia e enfrentar estes e outros problemas que são ameaças sérias às nossas convivências democráticas, com o argumento de que isso pode incomodar o mandatário de outro país”.
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“Parece-me uma falta de respeito à nossa soberania e dignidade nacional dizer que aqui não se pode realizar um encontro de alto nível para conversar sobre democracia porque isso pode desagradar ao presidente dos Estados Unidos. Parece-me pouco patriótico, insisto, uma falta de respeito à nossa dignidade nacional, porque, além disso, são temas necessários”, continuou.
Além de dialogarem entre si, os mandatários tiveram um encontro com líderes sociais, acadêmicos, cientistas e organizações internacionais, além de participarem de um encontro cidadão “para reafirmar que a defesa da democracia é um processo coletivo que requer a participação ativa de organizações sociais, cidadãs e territoriais”.
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