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Cannabrava | O poder do Comando Vermelho e os vazios do Estado brasileiro

O Comando Vermelho, uma das facções criminosas mais antigas do Brasil, tem demonstrado uma impressionante capacidade de expansão, organização e domínio territorial. Originado no fim dos anos 1970 no presídio da Ilha Grande, no Rio de Janeiro, o grupo nasceu da convivência entre presos comuns e presos políticos que haviam combatido a ditadura militar. Ali, os criminosos aprenderam com os militantes táticas de organização, disciplina e guerrilha urbana, que se tornariam fundamentos da atuação do CV.

Mais do que um grupo de traficantes, o CV se estruturou como uma organização com projeto de poder. Consolidou seu domínio nas favelas e periferias do Rio de Janeiro, onde impõe sua própria ordem, substituindo o Estado. Estudos apontam que é o único grupo armado que ampliou território nos últimos anos na região metropolitana do Rio. Essa expansão foi favorecida pelo enfraquecimento das milícias e pela ausência de políticas de presença estatal efetiva.

A força do CV, no entanto, não se limita à capital fluminense. A facção vem se espalhando por diversas regiões do país, incluindo a Amazônia Legal. Aproveitando-se das rotas de tráfico pouco fiscalizadas e da presença fraca do Estado, o grupo já domina territórios no Amazonas, Acre e Pará. Em muitos desses lugares, impõe seu controle com métodos violentos e domina atividades além do tráfico de drogas.

O Comando Vermelho também está presente no litoral norte de São Paulo e no Vale do Paraíba, em regiões do Mato Grosso e em outros interiores do país. Em São Paulo, ocupando o vazio deixado pelo Primeiro Comando da Capital (PCC), o CV está atuando na região norte do estado, em cidades como Rio Claro, Araras e Santa Bárbara d’Oeste  — onde inclusive foi descoberta uma fábrica clandestina de fuzis com capacidade de produzir mais de 3.500 armas por ano.

Seu modelo de atuação vai além do crime tradicional: grilagem de terras, loteamento ilegal, cobrança por serviços como internet, gás, TV, além do controle do cotidiano em comunidades inteiras.

Estudos recentes o colocam como o segundo maior grupo criminoso em influência e expansão no Brasil, ficando atrás apenas do PCC. Além disso, há indícios de alianças com grupos estrangeiros, especialmente em rotas internacionais do tráfico.

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O CV não é um simples grupo de traficantes. É um projeto de poder armado, territorial e econômico, que avança onde o Estado recua. Onde falta o Estado, entra o Comando. Sua presença escancara o fracasso das políticas de segurança baseadas apenas na repressão e no extermínio. Enquanto não houver presença efetiva do Estado com educação, saúde, justiça social e desenvolvimento, o espaço continuará sendo ocupado pela lógica do crime organizado.

Na Bahia e no Ceará, recentemente, foram efetuadas prisões de dirigentes do Comando Vermelho sem a necessidade de um único disparo, o que contrasta de forma escandalosa com a incompetência e/ou incoerência do Rio de Janeiro, onde uma megaoperação deixou mais de uma centena de mortos para capturar alguns quadros da facção.

Denunciar o poder do CV é, ao mesmo tempo, denunciar a ausência da República em grandes porções do território nacional. É exigir um projeto de Brasil onde não haja lugar para estados paralelos armados nem para territórios abandonados.

As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul Global.

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