O ex-presidente Álvaro Uribe Vélez (2002-2010), o líder mais representativo da direita colombiana, foi absolvido nesta terça-feira (21) dos crimes comuns de fraude processual e suborno de testemunhas.
Uribe Vélez havia sido condenado a 12 anos de prisão em primeira instância pela juíza Sandra Heredia, e um tribunal de Bogotá, em segunda instância, anulou a sentença. No entanto, uma das três magistradas que compõem o tribunal, Leonor Oviedo, divergiu e subscreveu integralmente a sentença que o havia considerado culpado e o enviado à prisão: “Havia, sim, provas suficientes para confirmar a condenação”, afirmou.
O tribunal anulou a sentença de culpabilidade por ambos os crimes e declarou não ter encontrado provas suficientes para incriminar Uribe, ao considerar que as escutas telefônicas apresentadas como evidência eram ilegais e que houve falhas na “metodologia” da juíza que proferiu a sentença em primeira instância.
O processo contra o ex-presidente começou em 2012, quando ele apresentou uma denúncia por difamação contra o então senador de esquerda Iván Cepeda Castro, que o acusava de procurar em presídios testemunhas que o vinculassem ao paramilitarismo. A Corte Suprema rejeitou a denúncia contra Cepeda e, em uma reviravolta inesperada, abriu um processo contra Uribe, suspeitando que era ele quem tentava manipular o depoimento de testemunhas.
Não por acaso, um dos primeiros a reagir à absolvição de Uribe foi Castro: “É claro que respeitamos a decisão da Justiça, mas não compartilhamos dela. Buscaremos a cassação (última instância judicial) para fazer valer nossos direitos e confirmar a decisão de primeira instância. Nossas provas nunca foram examinadas seriamente”, declarou.
A decisão surpreendeu o país, pois se dava como certo que, ao menos por um dos dois crimes, o ex-presidente ultradireitista, fundador do partido Centro Democrático, seria condenado.
Trump mente: Petro mostra por que é “inimigo”, e não “líder” do narcotráfico da Colômbia
Toda a ala da direita, composta por forças de extrema e de centro-direita, celebrou com entusiasmo a decisão judicial. O primeiro a fazê-lo foi o próprio Uribe Vélez, que escreveu em sua conta na plataforma X: “Graças a Deus, fez-se justiça.”
O secretário de Estado dos Estados Unidos, Marco Rubio, também comentou no X sobre o caso: “A justiça prevaleceu”, afirmando que Uribe havia sido vítima de uma “caça às bruxas.”
Essa decisão dá novo fôlego a uma direita fragilizada e com grandes dificuldades para transmitir aos eleitores uma mensagem capaz de devolvê-la ao poder em 2026, quando a Colômbia elegerá novos parlamentares e o próximo presidente da República.
“Nesta decisão subjaz uma mensagem poderosa para a esquerda: a direita está disposta a tudo para recuperar o poder em 2026”, afirmou Mario Ramírez, advogado e analista político, para quem a decisão transcende o campo judicial.
No entanto, a campanha está apenas começando, e sobre o absolvido por crimes comuns — não políticos — Álvaro Uribe Vélez, ainda pesam acusações relacionadas a crimes de lesa-humanidade, como as execuções extrajudiciais (conhecidas como “falsos positivos”) de jovens humildes assassinados durante seus dez anos de governo, apresentados pelos militares como guerrilheiros em troca de recompensas.
Outros crimes, como os massacres de El Aro e La Granja, que deixaram mais de 50 mortos, e o assassinato do defensor de direitos humanos Jesús María Valle, também fazem parte do conjunto de acusações contra Uribe Vélez — fatos ocorridos quando ele era governador de Antioquia (1995-1997), região onde se originou o paramilitarismo que o levou à presidência.
A esquerda se reúne
Na esquerda, soaram os alarmes. Sem dúvida, a decisão judicial revitaliza a direita, que, se souber se organizar, pode obter ganhos políticos. Ainda assim, faltam seis meses para a primeira disputa eleitoral parlamentar, em março de 2026.
Para esta sexta-feira (24), o presidente Gustavo Petro convocou os colombianos à Praça de Bolívar para uma marcha sob o lema “Soberania Nacional. Vamos pelo poder constituinte”.
Petro permanece inabalável. Além de não poupar críticas ao seu adversário político Uribe Vélez, voltou a colocar na mira o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump.
Em uma detalhada postagem no X, Petro denunciou as antigas relações de Uribe Vélez com o narcotráfico e os paramilitares: “Agora o ‘cartel da toga’ (apelido dado pela imprensa a um grupo de juízes que vendiam sentenças) tenta deixar impune o ex-presidente, aquele que, por meio das Convivir (cooperativas de vigilância), espalhou o paramilitarismo ligado ao narcotráfico em Antioquia e no país, e que assassinou mais de 90 mil colombianos.”
O presidente recordou também que, em 24 de abril de 1997, realizou um debate sobre o paramilitarismo em Antioquia, no qual demonstrou como Uribe Vélez, sendo governador, autorizou sobrevoos enquanto camponeses eram assassinados em povoados inteiros. Provou-se, além disso, que seu pai era “dono de um helicóptero que apareceu nas buscas ao maior laboratório de cocaína da Colômbia.”
Trump, o golpe e as próximas eleições
Na atual conjuntura política, Petro segue firme na defesa de seu projeto de governo e, diante da crise com os Estados Unidos, utilizou a questão de Uribe para enviar uma mensagem a Trump: “Agora, o presidente mais poderoso do mundo me acusa de ser líder do narcotráfico”, escreveu, acrescentando que essa postura “causa risos em todo o povo colombiano” e “coloca a Colômbia nas piores injustiças diante do mundo”. Os colombianos, ainda segundo Petro, conhecem sua luta política.
O líder sul-americano seguiu: “O presidente Trump não gosta que estejamos fora de controle, e aqui devo informar ao meu povo e ao mundo por que me coloquei fora de controle: porque querem um golpe de Estado contra mim e porque o senador Bernie Moreno deseja violência contra a Colômbia a partir do governo dos Estados Unidos”, denunciou.
A convocatória de Petro para esta sexta-feira (24) ocorre em meio à pior crise diplomática com os Estados Unidos e Trump, mas, ao mesmo tempo — embora não o mencione diretamente —, acontece às vésperas da consulta interna que o Pacto Histórico realizará no domingo, dia 26, para escolher, por voto popular, os integrantes do Congresso e seu pré-candidato à presidência.
Petro: Fazer Trump mudar ou retirá-lo
À espera de que os Estados Unidos anunciem sanções tarifárias à Colômbia, Petro propôs nesta segunda-feira (20) que Trump reduza os encargos a 8% das exportações colombianas.
A iniciativa está no portfólio do encarregado de negócios do governo Trump em Bogotá, John MacNamara, com quem Petro se reuniu, acompanhado do embaixador da Colômbia em Washington, Daniel García-Peña.
“Tenho uma reunião com o encarregado de negócios — havia antecipado em uma entrevista anterior. Isso demonstra que Trump valoriza nossas relações comerciais”, afirmou Petro.
No entanto, adiantou que seu propósito não era o de “conceder” ao governo Trump, mas “exigir” que desmontem as tarifas de 8% sobre os produtos que hoje carregam essa taxa. “Toda tarifa sobre o produto agroindustrial deve desaparecer”, pontuou, ao afirmar que essa é a melhor maneira de combater as organizações do narcotráfico.
Novas críticas às ameaças dos EUA
O ministro do Interior, Armando Benedetti, entrou no debate ao rechaçar as declarações feitas por Trump no domingo (19), quando, em suas redes sociais, o republicano afirmou que a Colômbia deveria “fechar” os cultivos de coca “imediatamente” e que “se não o fizer, os Estados Unidos os fecharão”.
Para Benedetti, trata-se de “uma ameaça de invasão ou de uma ação terrestre ou militar contra a Colômbia”. Ao falar com a Rádio Blue, disse: “Não me imagino fechando alguns hectares se não for dessa forma, se não for invadindo.”
Já Gustavo Petro, em uma entrevista ao jornalista Daniel Coronell, da Univisión, na segunda-feira (21), reforçou que, nos Estados Unidos, os assessores de Trump querem montar outra mentira sobre a Colômbia. E advertiu: “Os narcos vivem lá, não aqui. Acham que somos povos envenenadores e não assumem que são consumidores.”
A seguir, questionou: “Como se fala com os Estados Unidos? Pondo-se de joelhos? Trump diz que a Colômbia está fora de controle. Mas é claro que está, fora do controle dele. Aqui não entram reis.”
“Prefiro seguir o caminho de Lula e Claudia, que nos leva a uma posição erguida e digna. Não humilhes o fraco porque não tens bombas, porque os humildes são multidões e a humanidade tem uma saída: mudar Trump”, concluiu, em referência aos presidentes do Brasil e do México.
Ele retomou o tema dos cultivos ilícitos de folha de coca, sobre os quais assegura que foram praticamente reduzidos em 100%, conforme mostra um estudo da Organização das Nações Unidas. “Não é verdade que estejamos inundados de cocaína. É mentira”, sentenciou.
No fim da entrevista, o jornalista comentou que esperava que Petro encontrasse a sabedoria para sair desse impasse, ao que o presidente respondeu: “Eu a tenho, o problema é que duvido que isso esteja na mente de Trump, mas confio que a reserva democrática das instituições americanas — que ainda não existe na Colômbia — seja capaz de colocar a ciência e a verdade acima da calúnia, da soberba e da cobiça.”
“Mas sua missão não é mudar Trump”, replicou o jornalista, e Petro respondeu: “A humanidade tem uma primeira saída, que é mudar Trump de diversas maneiras — pode ser pelo próprio Trump, a mais fácil. Se não, tirar Trump.”
Reunião de governo e ataques da extrema-direita
A jornada foi maratônica na Casa de Nariño, sede presidencial. Desde as primeiras horas de segunda-feira (20), reuniram-se a chanceler Rosa Yolanda Villavicencio, o embaixador García-Peña, assessores do gabinete presidencial, e o dia terminou com um conselho de ministros.
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Ainda não se sabe o resultado da reunião, mas é previsto que o presidente colombiano anuncie, em breve, as decisões adotadas para enfrentar as sanções do governo Trump, caso se concretizem.
Por sua vez, dois ex-presidentes de direita — Andrés Pastrana, do Partido Conservador, e Uribe — enviaram uma carta na qual “exigem do presidente Petro uma definição clara de sua relação com o chefe do Cartel de los Soles, Nicolás Maduro.”
Esse foi o tom da oposição contra o presidente colombiano, que respondeu aos dois ex-mandatários recomendando-lhes resolver seus próprios problemas com a Justiça.
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