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6 anos após “estallido social”, Chile segue na contramão da mudança prometida

A mobilização de 2019 visava reverter o neoliberalismo instaurado por Pinochet e consolidado por 30 anos de governos democráticos; o que hoje se vê, porém, é um Chile ainda mais retrógrado

O Chile rememorou, no último sábado (18), o 6º aniversário do “estallido social” (explosão social, em tradução livre) que começou entre a tarde e a noite do então dia em 2019, quando um protesto estudantil, rejeitando um aumento na passagem do metrô de Santiago, se converteu em um levante de milhões de pessoas que só a quarentena forçada da covid-19 conseguiu conter.

Aos estudantes se somaram centenas de organizações com interesses diversos, cujas demandas interpelavam a classe política e denunciavam o abuso cotidiano que o mercantilismo imperante, junto a um Estado incompetente, cometia em todos os âmbitos da vida das pessoas.

Isso continua acontecendo: em 15 de outubro, soube-se que as empresas elétricas estão há oito anos (!) cobrando uma tarifa mais alta do que a devida, porque o órgão estatal responsável por fixar os preços comete um erro de cálculo. E, embora o regulador tenha sido o responsável pela falha sistemática, é impossível, dizem analistas, que as elétricas não a tenham detectado, já que seus especialistas revisam exaustivamente o decreto tarifário semestral — mas permaneceram caladas.

Se a mobilização de 2019 pareceu impulsionar o país rumo a um destino distinto do neoliberalismo instaurado pela ditadura de Pinochet e consolidado desde 1990 por 30 anos de governos democráticos, hoje o Chile se move a um rumo bem mais retrógrado.

As reivindicações que caracterizaram o 18-O foram substituídas pela exigência de segurança pública como resposta ao medo de ser vítima da criminalidade — e por uma quase xenofobia contra centenas de milhares de migrantes que ingressaram ilegalmente no país, percebidos como catalisadores de uma onda criminosa marcada pela violência.

Eleições

O aniversário do 18-O ocorre faltando um mês para a eleição presidencial e legislativa de 16 de novembro, cuja campanha transcorre capturada por esses temas.

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O principal candidato da ultradireita, o republicano José Antonio Kast, enfatiza que seu “Plano Implacável será uma declaração de guerra contra o crime organizado”, com presídios de segurança máxima, endurecimento de penas e envio de militares e policiais a zonas críticas. Promete fechar a fronteira com o Peru e a Bolívia instalando muros, valas e cercas perimetrais, deportar milhares de pessoas e fazer um “governo de emergência”.

Seu principal assessor chama os empregados públicos de “parasitas”, enquanto outro promete demitir 100 mil. Interpelado, Kast é incapaz de especificar quem seriam os demitidos e tampouco como fará para cortar 6 bilhões de dólares em gastos fiscais nos primeiros 18 meses de um eventual governo, conforme prometido.

Na sexta-feira (17), em uma escola pública de Santiago, onde foi promulgada uma lei que repara uma dívida monetária histórica do Estado com o magistério, o presidente Gabriel Boric respondeu:

“Aqui trabalham 40 professores e professoras, são funcionários públicos. Alguém poderia dizer que não estão fazendo seu trabalho? Que estes professores não estão construindo um bairro melhor? Que estão se aproveitando do Estado? Eu creio que não”, disse.

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Acrescentou que “lançar frases tão levianas é de uma sem-vergonhice tremenda, porque quem o faz fere e ofende a grande maioria dos trabalhadores públicos que, dia após dia, se esforça para construir um país melhor”.

Assim, sem mencionar o 18-O, Boric se envolvia na contenda eleitoral, que, ao que tudo indica, será decidida em segundo turno, em dezembro, entre Kast e a candidata governista, a militante comunista Jeannette Jara.

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