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Encenação: enviado dos EUA visita Gaza para negar catástrofe administrada por Israel

Visita de Steve Witkoff é campanha publicitária para questionar os relatórios da ONU e limpar a imagem da Fundação Humanitária de Gaza — gerida por Israel e responsável pelas armadilhas mortais com comida

O enviado do presidente estadunidense Donald Trump, Steve Witkoff, não precisava visitar Rafah para constatar a dimensão da tragédia na Faixa de Gaza. As imagens falam por si, os corpos emagrecidos não foram escondidos pelos túneis e os gritos das mães não precisam de tradução diplomática. Witkoff não veio para ver, mas para negar. Não trouxe esperança, mas tentou encobrir o crime.

Desde que os Estados Unidos e Israel começaram a militarizar a comida e transformá-la em ferramenta de chantagem coletiva, as ajudas humanitárias tornaram-se armadilhas mortais. O ex-funcionário da chamada “Fundação Humanitária de Gaza”, Anthony Aguilar, confirmou isso claramente: “Nunca recebemos orientação alguma para proteger civis. Os locais de distribuição de ajuda foram projetados para serem armadilhas mortais”. Essa fundação, que se esconde atrás de um nome humanitário, atua como braço operacional de segurança israelense, com cumplicidade explícita dos Estados Unidos.

A encenação protagonizada por Witkoff, coordenada integralmente com o exército de ocupação e os “guardas” da empresa estadunidense-israelense, fez parte de uma campanha publicitária para limpar a imagem dessa instituição fascista e questionar abertamente os relatórios emitidos pela Organização das Nações Unidas (ONU). Mas o comissário-geral da Agência das Nações Unidas de Assistência aos Refugiados da Palestina no Próximo Oriente (UNRWA), Philippe Lazzarini, esclareceu a situação com precisão:

A fome em Gaza não é resultado de incapacidade, mas consequência de tentativas israelenses deliberadas de substituir o sistema das Nações Unidas pela chamada ‘Fundação Humanitária de Gaza’, politicamente motivada. Trata-se de uma medida intencional para punir os palestinos apenas porque vivem em Gaza.

Benjamin Netanyahu e Steve Witkoff, durante encontro na Casa Branca em 7 de julho de 2025 (Foto: Daniel Torok)

A declaração de Lazzarini desnuda a intenção criminosa por trás daquilo que é vendido sob a capa das ‘ajudas’: esfomear os palestinos até que se submetam e transformar o alimento, que é um direito, em armadilha. Para piorar, Witkoff se vangloriou de que a empresa estadunidense distribui “um milhão de refeições diárias”, enquanto imagens revelam crianças se alimentando de folhas de árvores e socorristas incapazes de carregar os corpos esqueléticos dos escombros.

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O crime não reside apenas no bloqueio, mas em gerir o bloqueio como instrumento para criar uma nova realidade política: desarmamento, expulsão silenciosa e a transformação de Gaza num ente submisso sob gestão conjunta de segurança estadunidense e israelense, com uma falsa fachada humanitária que concede ao ocupante um escudo jurídico e moral ilusório.

O mais perigoso, porém, é que o cenário que se prepara não visa apenas terminar a guerra, mas impor pela força uma solução estadunidense-israelense, começando pelo que chamam de “ajuda”, passando pela desidratação da resistência e concluindo num “acordo abrangente” sob medida para o ocupante: sem armas, sem soberania, sem direito de retorno. É como se restasse aos palestinos apenas escolher entre morrer de fome e morrer subjugado.

Aqui fica evidente o paradoxo trágico: enquanto os contornos do projeto nacional palestino desmoronam em certos setores, repetindo cálculos estreitos que priorizam slogans ao invés das pessoas, o povo se afoga em seu próprio sangue, não para ganhar uma batalha, mas para sobreviver. O dilema está claro: um projeto nacional que recupere a iniciativa ou o desaparecimento alimentado pela arrogância, obstinação e negação.

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O que Gaza precisa não é de um milhão de refeições sob o controle de uma “empresa da morte”, mas do fim imediato da agressão, a retirada total da ocupação do território e a retomada de uma decisão palestina livre em um programa abrangente de libertação que coloque o ser humano no centro da luta, e não no fim da fila das prioridades.

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A visita de Witkoff não abre portas para a esperança, mas revela a profundidade da cumplicidade dos Estados Unidos, confirmando que uma solução política real ainda não está madura, e que tudo que está sendo oferecido hoje é uma tentativa fracassada de separar a ajuda da justiça, a fome da resistência, a perseverança da liberdade.

E permanece a pergunta mais urgente: será que palestinos, árabes e as pessoas livres do mundo vão agir para pôr fim a essa diabólica encenação? Ou Gaza será deixada para morrer sob a clemência de um acordo de “comida por silêncio”?

* Edição de texto: Alexandre Rocha

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