O papel estratégico das mídias e think tanks na cooperação e desenvolvimento em áreas importantes para o chamado Sul Global foi o centro dos debates ocorridos durante o 7º Fórum de Mídia e Think Tanks do Brics, realizado no dia 16 de julho de 2025, na cidade do Rio de Janeiro, Brasil. Com o tema “Brics Unido: Forjando um Novo Capítulo para o Sul Global”, as autoridades e os palestrantes presentes fizeram observações de como promover, no âmbito do Brics+, a cooperação em inteligência artificial, reformas e inovação “das estruturas de governo e no estabelecimento de padrões técnicos aos interesses do Sul Global, alcançando amplo consenso”, como descrito na folha de apresentação do evento.
Organizado pela Agência de Notícias Xinhua, da China, parceira da Revista Intertelas, em colaboração com a Empresa Brasileira de Comunicação (EBC), Brasil 247 e Monitor Mercantil, a iniciativa contou com mais de 250 representantes oriundos de quase 150 organizações, incluindo mídia, think tanks, organizações governamentais e empresas de 36 países. Durante o evento, ainda foram lançados o Programa de Parceria Conjunta de Comunicação do Sul Global, que opera por meio de duas plataformas: o Fórum de Mídia e Think Tank do Sul Global e a Rede de Notícias da Mídia do Sul Global, visando promover o intercâmbio e a colaboração prática entre os países; o relatório de think tank intitulado “Cooperação do Brics: Impulsionando o Progresso Conjunto do Sul Global”, desenvolvido pelo Instituto Xinhua, um centro de estudos de alto nível vinculado à Agência Xinhua; além do relatório “A Ascensão do Sul Global”, “que documenta as práticas inovadoras do Sul Global rumo à autossuficiência e ao desenvolvimento”, como destacou o presidente executivo do Fórum e presidente da Agência de Notícias Xinhua , Fu Hua, durante seu discurso no painel de abertura que foi composto por diversas autoridades de governos e representantes de agências nacionais de vários países e empresas. Na sequência, ocorreram sessões plenárias e seminários temáticos sobre IA. Confira os destaques da Intertelas sobre o evento abaixo.


“A Xinhua está nessa missão de fazer sua contribuição para o fortalecimento da cooperação de notícias, e aumentar o intercâmbio, mostrando a força dos países do Sul, para que possamos juntos rumar para um futuro de paz, segurança, prosperidade e progresso”, enfatizou o presidente da Xinhua. Ele ainda relembrou algumas palavras de Xi Jinping que sempre atribuiu grande importância à cooperação do Brics e ao desenvolvimento cooperativo dos países do Sul Global. “Ele afirmou que os países Brics se uniram por um objetivo comum, em consonância com a tendência de paz e desenvolvimento mundial, e que devemos transformar o Brics em um canal principal de solidariedade e cooperação do Sul Global, bem como em uma força pioneira na reforma da governança global… O presidente Xi ressaltou que os países escolheram de forma independente seus caminhos de desenvolvimento. Defendem, coletivamente, seus direitos de desenvolvimento e avançam juntos rumo à modernização, influenciando profundamente o processo de desenvolvimento mundial. Em quase 20 anos, o PIB dos Brics representa mais de 30% da economia mundial e sua contribuição para o crescimento global ultrapassa 50%. Cada vez mais países do Sul Global se aproximam e se integram aos Brics, demonstrando anseio por unidade e prosperidade”, salientou Fu Hua.


Na mesma linha do presidente da Xinhua, durante a sessão plenária sobre IA, o diretor-geral da Empresa Brasileira de Comunicação (EBC), Bráulio Costa Ribeiro, afirmou que o Brics é, antes de tudo, um espaço onde vozes que por muito tempo estiveram à margem das narrativas dominantes ganham lugar e ressonância no cenário internacional. “Temos uma responsabilidade comum: a de promover conteúdos que contribuam para a soberania informativa de nossas populações, a valorização de nossas culturas e o enfrentamento aos desafios da desinformação, da intolerância e da exclusão digital”. Segundo ele, quando guiada por princípios éticos, a inteligência artificial pode ampliar o acesso à informação, personalizar a entrega de conteúdos de interesse público e fortalecer a inclusão digital.


“Para países como os nossos, com realidades sociais complexas, a IA pode ser um instrumento para reduzir desigualdades e aproximar o Estado de seus cidadãos, sempre com transparência e respeito aos direitos humanos. Por isso mesmo, saudamos a aprovação, por unanimidade, da Declaração dos Líderes do Brics+ sobre governança global da inteligência artificial, na 17ª Cúpula do Brics”. O diretor-geral da EBC ainda disse que a guerra tarifária global iniciada pela atual gestão do governo dos Estados Unidos e a fragilização de instituições multilaterais revelam a importância de espaços como esse. “As mídias públicas dos países do Brics têm um papel estratégico na promoção de narrativas que reflitam nossos interesses comuns e que fortaleçam uma ordem internacional mais equilibrada, justa e multipolar”.

Nas palavras do CEO do Brasil 247, Leonardo de Rezende Attuch, não se deve mais permitir que as realidades, as histórias e os desafios dos países do Brics+ sejam interpretados, traduzidos ou distorcidos a partir dos interesses do Norte Global, muitas vezes marcados por resquícios imperialistas e colonialistas. “Chegou a hora de construirmos um novo paradigma de comunicação – um paradigma que reflita nossa diversidade, nossas culturas e nossos valores. Nesse sentido, o intercâmbio entre os meios de comunicação do Sul Global – ou da maioria global, como muitos já dizem – torna-se essencial. Mas é preciso ir além. O tempo atual exige de nós mais do que um intercâmbio cultural, ele exige um intercâmbio ideológico, um debate profundo de ideias, que envolva também as universidades, os centros de pesquisa e os think-tanks. Só assim poderemos construir uma narrativa própria e sólida para o nosso tempo”.
Conforme Attuch, no intuito de evitar que a comunicação seja controlada por interesses privados e corporativos, possibilitando no avanço da polarização, dos discursos de ódio e da ascensão de projetos autoritários e de extrema-direita, sua proposta para os países do Brics é: estreitar pontes de forma concreta, criando uma grande agência de notícias que integre os veículos de comunicação do Sul Global; criar novas plataformas digitais, em que os algoritmos não fortaleçam os interesses das grandes corporações; e lançar as bases para a adoção de modelos de inteligência artificial de código aberto, que possam democratizar a tecnologia que será decisiva no século 21. “Vamos transformar os Brics não apenas em uma aliança política e econômica, mas também em uma aliança comunicacional e ideológica, que seja a esperança concreta de um novo mundo. Um mundo baseado na paz, na cooperação e na harmonia entre os povos”.

De acordo com o discurso do editor do Monitor Mercantil, Marcos Costa de Oliveira, o sucesso da Cúpula do Brics 2025 também pode ser medido pela reação dos países que insistem em frear as mudanças que ocorrem no mundo. Especialmente o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, que ameaçou impor tarifas sobre os países do Brics e, no caso específico do Brasil, tenta se intrometer nos assuntos internos do país e atacar sua soberania. “Juntos, os países do Brics+ representam 48,5% da população mundial; 36% do território; 39% do PIB; 24% do comércio global; 76% das reservas mundiais de terras raras; 43,6% da produção de petróleo; 36% da produção de gás; e 78,2% da produção global de carvão. O planeta está mudando. O mundo unipolar aprisionado pela hegemonia financeira não existe mais. A imensa desigualdade produzida por esse sistema não pode ser mantida. O crescimento a qualquer custo está dando lugar ao desenvolvimento sustentável. As pessoas, todos os habitantes do planeta, têm direito a uma vida digna e a um futuro promissor”.
Brics+: em defesa do multilateralismo, da multipolaridade, da igualdade, da justiça e da paz


Segundo o presidente da Associação de Diplomacia Pública da China, Wu Hailong, o Brics representa a ascensão coletiva e a vanguarda do Sul Global. Ele salientou que alguns países não veem o Brics com bons olhos e acham que o agrupamento é contra os Estados Unidos e o ocidente… “O mecanismo Brics desde o seu início nunca se opôs a ninguém e nunca se envolveu em conflitos de blocos, nem em disputas geopolíticas… O crescimento do Brics encontra sempre essas reclamações e intimidações, mas nós não nascemos ontem, não vamos parar de criar cordeiros em razão do uivar dos lobos. Temos que trabalhar com as coisas que achamos corretas e seguir o caminho que consideramos correto. Não devemos ser intimidados pelas difamações e pelas ameaças”.
Para Wu Hailong, o mundo está cada vez mais turbulento, com o surgimento do unilateralismo, protecionismo e política do poder. “Estamos voltando para a regra da selva. Além disso, estamos enfrentando vários conflitos geopolíticos e disputas comerciais. Diante de um mundo dessa forma, os Brics devem se unir ainda mais para defender os próprios interesses e de todo o Sul Global para compartilhar as oportunidades de crescimento. Os Brics devem aproveitar as próprias vantagens para abrir novas fronteiras de cooperação e aproveitar esta oportunidade de crescimento, elevando o nível de parceria financeira internacional para garantir a estabilidade das cadeias de suprimento e produção. Vamos ampliar a nossa parceria de ganhos mútuos”. Nas palavras dele, os países do Brics têm suas diferenças históricas e reais e há também discordâncias dentro do próprio grupo, mas ao seguir o espírito de cooperação, de consulta harmoniosa, é possível resolver qualquer tipo de problema.


De acordo com o presidente do Parlamento Centro-Americano, Carlos Hernández Castillo, o Fórum de Mídia do Brics reflete o dinamismo, a visão estratégica e a crescente influência do Sul Global nos assuntos do mundo. Para Castillo, a transformação da ordem global demanda novas alianças e novas ideias. Assim, os países que integram o evento marcarão uma rota clara, que é fortalecer a cooperação Sul-Sul, fomentar o desenvolvimento mais equitativo e construir um mundo onde todos tenhamos um lugar digno à mesa global.

“No primeiro painel será abordada a cooperação como o motor de desenvolvimento para o Sul Global. No segundo, sobre inteligência artificial e o futuro digital compartilhado, é imprescindível lembrar que a IA não deve aumentar as desigualdades, mas eliminá-las. Assim, prezamos por um foco ético e acessível para o Sul Global, que garanta transparência tecnológica, acesso equitativo à inovação e à informação do capital humano. No terceiro painel, que será sobre a cooperação e a governança no contexto atual, queremos reconhecer que estamos em uma conjuntura histórica para uma governança mais representativa, mais participativa e mais solidária, que é possível se a diversidade de modelos for visibilizada. Por fim, no quarto painel, sobre a crescente influência do Sul Global, afirmamos com orgulho que as nossas regiões têm muito a dizer e mais para contribuir”.

Em seu discurso, a cônsul-geral da China no Rio de Janeiro, Tian Min, citando uma carta do embaixador da China no Brasil ao evento, Zhu Qingqiao, ressaltou que a modernização não é um privilégio de poucos países, mas é um direito de todos. Para ela e o embaixador chinês, a mídia e os think tanks devem analisar essa situação no contexto histórico para identificar o caminho de modernização para o Sul Global, dando ideias e sugestões, enaltecendo o espírito Brics para fortalecer a parceria. “O mecanismo Brics oferece uma plataforma para a cooperação do Sul Global… Vamos promover a aprendizagem de civilizações. Cada um dos países do Brics tem uma civilização maravilhosa, portanto esse intercâmbio tem um grande futuro. É nesse intercâmbio que vamos criar forças. Assim, mídias e think tanks devem assumir essa função de ponte de conexão para ampliar as comunicações e a compreensão dos povos. Vamos trabalhar para difundir o conceito de sustentabilidade. Os países do sul precisam aderir a essa campanha, a esse movimento. Vamos trabalhar com a opinião pública, com a imprensa para defender essas ideias, para formar uma sinergia no combate às mudanças climáticas e fortalecer nossa voz nos mecanismos multilaterais”.


No discurso do diretor do Departamento de Mídia Internacional da Secretaria de Comunicação Social do Brasil, Gustavo Almeida Raposo, é salientado que o Brics é o esteio na defesa do multilateralismo. Conforme ele, as prioridades escolhidas pela presidência brasileira do Brics 2025 refletiram as grandes questões atuais da humanidade. “O Brasil liderou a negociação da Declaração de Líderes do Rio de Janeiro…A declaração tratou de temas geopolíticos, cooperação e condenação de imposição de tarifas unilaterais. Outros resultados relevantes também foram alcançados no contexto dessa cúpula, como as parcerias para eliminar doenças socialmente determinadas, iniciativas para avançar na reforma do FMI e uma declaração em apoio a uma convenção das Nações Unidas sobre cooperação tributária internacional”.

Segundo Raposo, o Brics neste ano também demonstrou, mais uma vez, a força de sua atuação conjunta ao adotar declarações sobre finanças climáticas e uma arquitetura para a inteligência artificial. Citando o presidente Lula, ele disse que as novas tecnologias devem atuar dentro de um modelo de governança justo, inclusivo e equitativo. O desenvolvimento de IA não pode se tornar um privilégio, nem ser um instrumento de manipulação na mão de milionários. Tão pouco é possível progredir esse tempo sem a participação do setor privado e das organizações da sociedade civil.

Wang Quanchun, vice-diretor do Instituto de História e Literatura do Partido, do Comitê Central do Partido Comunista da China, disse que hoje o Brics abrange países importantes da Ásia, África, América Latina e Oriente Médio. Segundo ele, a atratividade e a influência do Brics estão crescendo cada vez mais e o grupo está se tornando uma plataforma de cooperação cada vez mais importante entre mercados emergentes e países em desenvolvimento. “Olhando para o futuro, os países do Sul Global vão marchar juntos para a modernização. Isso é um feito histórico de grande significado e sem precedentes. No entanto, esse futuro promissor não vai surgir automaticamente e a revitalização do Sul Global ainda vai enfrentar desafios. Diante das atuais incertezas e da erosão dos princípios de cooperação internacional, a missão histórica dos países do Sul Global, incluindo a China, é clara: avançar em uma modernização e promover uma ordem internacional mais justa e equitativa”. De acordo com ele, há obstáculos para enfrentar, mas os países do Brics constituem uma força positiva, estável e construtiva.
No que diz respeito ao desenvolvimento chinês, Wang Quanchun argumentou que, sob a liderança do Partido Comunista da China, o povo chinês percorreu um caminho árduo, mas com próprias características. Para ele, a modernização chinesa representa uma inovação teórica e prática significativa. “Ela rompe com a ideia de que modernização é igual à ocidentalização e amplia o leque de caminhos disponíveis para os países em desenvolvimento que buscam autonomia. Essa experiência oferece uma valiosa referência para o Sul Global. Os países do Brics, apesar das diferenças em sistema, cultura e região, construíram, juntos, uma bela história de cooperação solidária”.


Por sua vez, Mohamed Hussein Ibrahim Mahmoud, primeiro subsecretário do Serviço de Informação do Estado do Egito, lembrou que dois dos maiores desafios do Brics hoje são: ter mais poder estratégico de decisão em organizações internacionais como o Fundo Monetário Internacional e o Banco Mundial e diminuir a dependência do dólar estadunidense, criando uma moeda única do Brics. Além disso, “… promover todos os meios de cooperação entre países emergentes e em desenvolvimento contribui significativamente para o fortalecimento dos laços econômicos e financeiros entre esses países… da mesma forma, a diversificação da economia global depende da busca dos Brics em potencializar seus papéis na economia global, o que contribui para reduzir a dependência dos países desenvolvidos, promovendo um desenvolvimento sustentável… O Brics representa mais de 45% dos habitantes do globo terrestre e isso lhes dá uma força muito grande na economia e no crescimento mundial. O grupo ainda possui um papel muito significativo na produção do gás e do petróleo, tendo um papel estratégico na geopolítica energética global”, disse Mahmoud.
Brics+ e a busca pelo fim da hegemonia ocidental e por uma outra perspectiva no campo da mídia e da comunicação
Marydé Fernández Lopes, vice-chefe do Departamento Ideológico do Comitê Central do Partido Comunista de Cuba, recordou que a trajetória dos povos do Sul Global foi marcada por séculos de dependência, roubo e subordinação. Segundo ela, o Brics+ é o bloco que desafia essa hegemonia em meio à crise multidimensional atual, propondo uma nova ordem mais justa e soberana. “O Partido Comunista de Cuba, como Estado-membro associado desde o 1 de janeiro de 2025, assume com grande responsabilidade essa tarefa, de acordo com os princípios da sua diplomacia revolucionária, de respeito à soberania e à independência, à autodeterminação dos povos, ao internacionalismo, à solidariedade entre as nações, à paz e ao multilateralismo, sobre a base da Carta das Nações Unidas”.
“No autodesenvolvimento do Brics, os sistemas de pagamento alternativo, o acordo de cooperação tecnológica e a ampliação do grupo são o avanço concreto para essa nova configuração. O desenvolvimento não pode seguir os moldes impostos pelo Norte. Nós precisamos nos inserir nos mercados controlados pelas grandes corporações para garantir direitos, soberania, bem-estar coletivo e equilíbrio ecológico. Uma das principais frentes dessa batalha é a comunicação. A guerra cognitiva se tornou uma ferramenta central para o controle político”.

Conforme Lopes, os meios de comunicação do Brics e do Sul Global em seu conjunto têm o dever histórico de cooperar para romper barreiras informativas e democratizar o seu acesso no mundo. “A responsabilidade não é secundária, nem ornamental, é estratégica”, salientou. Para ela, a resistência dos meios de comunicação de Cuba é uma escola para o Brics na construção de uma estratégia comunicacional a serviço dos povos do bloco. “A luta por meios de comunicação justos, plurais e soberanos no Sul não pode ser limitada ao técnico e ao profissional. É uma tarefa política, cultural e civilizatória e nesse sentido reiteramos a nossa posição para integrar esforços comuns nas seguintes direções: infraestrutura digital soberana, fomentar marcos de políticas públicas que democratizem o acesso à comunicação e promovam meios sem fins lucrativos e equalitários, fomentar a cooperação entre jornalistas e construir uma narrativa global do Sul que visibilize experiências de sucesso e fortaleça o trabalho coletivo frente ao imperialismo”.
Nas palavras de Lopes, promover uma educação mediática emancipatória, além de intercâmbios Sul-Sul entre comunicadores e jornalistas com perspectivas críticas anticoloniais, comprometidas com a integração social, torna-se algo essencial. Igualmente, deve-se fomentar redes transcontinentais entre meios públicos do Sul, promover repositórios de notícias para facilitar a informação colaborativa de temas-chave, desenvolver agência de notícias regionais com foco próprio para enfrentar a barreira mediática e fazer uma monitorização digital capaz de fiscalizar campanhas algorítmicas.

Em sua fala, Mikhail Gusman, primeiro vice-diretor geral da Agência de Notícias Russa TASS, como publicado pela Xinhua em português, disse que a mídia global está enfrentando desafios sem precedentes: um dilúvio de desinformação, revisionismo histórico e interrupções tecnológicas corroendo os próprios fundamentos da verdade. Em especial, ele lembrou que, no âmbito do 27º Fórum Econômico Internacional de São Petersburgo, realizado no ano passado, a TASS e a Agência Xinhua, apresentaram um projeto que simboliza os valores compartilhados de seus países em uma exposição dedicada aos 80 anos da grande vitória contra o fascismo, o nazismo alemão e o militarismo japonês. Gusman também enfatizou que a revolução da inteligência artificial exige de profissionais da mídia: solidariedade, prontidão para diálogo e respeito aos princípios fundamentais do jornalismo, como verdade, objetividade e responsabilidade perante a sociedade. “Nós nos reunimos no momento quando o fortalecimento de uma ordem multipolar justa não é só uma ideia, não é só um ideal, mas uma necessidade”.


Na mesma linha, Yeidckol Polevnsky Gurwitz, presidente do Comitê de Relações Exteriores Ásia-Pacífico do Senado Mexicano, trouxe dados que mostram como o Brics é importante na busca por um equilíbrio de poder com o ocidente. De acordo com ela, o México compartilha mais de 3 mil quilômetros de fronteira com os Estados Unidos e 80% do intercâmbio comercial do país é dirigido aos EUA. “Temos um Tratado de Livre Comércio com os Estados Unidos e o Canadá e, apesar desse acordo, o México sofre todo tipo de ameaças e aumento de impostos e, há três dias, disseram que teremos 30% de taxas. Assim, estamos em um momento muito complexo, no qual é preciso impulsionar uma mudança. E quando acreditávamos que já tínhamos nos livrado do neoliberalismo, parece que há algo pior a vir. Parece que querem conservar o protecionismo não saudável e impor taxas e bloqueios a todo mundo. E se falamos de bloqueios, então temos a heroica Cuba, que enfrenta por mais de 60 anos um bloqueio criminoso com muita valentia e com muita dignidade que é preciso ser reconhecida, mas hoje esse bloqueio foi estendido à Venezuela e a muitos países”.
Gurwitz enfatizou que, em 1945, foram criadas as Nações Unidas para evitar uma Terceira Guerra Mundial. E, na época, muitos países se comprometeram com o desarmamento. No entanto, uma nova linha política volta a pedir aos países que aumentem os seus gastos com armas. “Isso é inaceitável. Esses gastos precisam ir para educação, saúde, programas sociais, como os países como China, Cuba fazem… Portanto, não é possível mais continuar se organizando sob uma lógica de desigualdade, de dependência e de exclusão”.

Para a segunda vice-presidente da Assembleia Legislativa do estado do Rio de Janeiro e deputada, Tia Ju, o bloco enfrenta desafios centrais, como manter a autonomia dos Estados-membros frente a pressões externas, diversificar a governança e implementar modelos inclusivos de desenvolvimento. “A construção de uma ordem global verdadeiramente multipolar exige que respeitemos nossa pluralidade sem renunciar à soberania nacional. O mundo atravessa uma era de incerteza marcada por crises políticas, climáticas e informacionais. Mais do que nunca, os meios de comunicação dos países do Brics têm uma responsabilidade significativa nessa nova era e desfrutam de um vasto espaço para a cooperação. Liberdade de imprensa, combate à desinformação, promoção da diversidade midiática, inovação tecnológica e enfrentamento dos desafios globais são pautas urgentes”.
Para a deputada carioca, o Brics tem a capacidade de mudar coletivamente o futuro do jornalismo global, o que para ela é algo imperativo, ético e civilizatório. “Precisamos enfatizar a importância de construir parcerias duradouras entre as organizações de mídia dos Brics e dos países em desenvolvimento. Precisamos de um novo protagonismo que não parta da homogeneização, mas da valorização das nossas diversidades culturais, históricas e políticas. Os meios de comunicação dos Brics devem trabalhar lado a lado, demonstrando responsabilidade ao se comprometerem a criar uma forte sinergia entre as mídias emergentes e expandir a influência legítima do Brics no cenário internacional”.


“Estamos falando, portanto, de um movimento estratégico, uma articulação que vai além da comunicação e alcança os campos da soberania, da integridade regional e da governança global”. Segundo Tia Ju, um desenvolvimento verdadeiramente robusto só existe quando caminha lado a lado da informação de qualidade. “Uma informação que eduque, que promova valores compartilhados como justiça, dignidade humana e cooperação. Como parlamentar, acredito que esse esforço de sinergia precisa estar refletido nas políticas públicas dos nossos países. O Brasil, por exemplo, vive hoje um momento de grande efervescência democrática, mas também enfrenta desafios como desinformação, discurso de ódio e ataques a diversidades religiosas e culturais. Precisamos de uma mídia comprometida com a verdade, com a ética e com a pluralidade de vozes. Precisamos intensificar a presença dos nossos povos negros, indígenas, periféricos, jovens, mulheres em nossa cobertura para que a sua experiência chegue de fato aos centros das narrativas globais”.

Nas palavras de Datuk Seri Wong Chun Wai, presidente da Agência Nacional de Notícias da Malásia (BERNAMA), estamos passando por uma era de transformação, em que a Associação de Nações do Sudeste Asiático (ASEAN) é uma força em crescimento, com um PIB combinado de 3,6 trilhões de dólares e abrigando mais de 600 milhões de pessoas. Segundo ele, a ASEAN não é apenas um bloco econômico vibrante, é um mercado consumidor significativo e uma ponte estratégica entre as regiões. “Nesse contexto, uma parceria mais estreita entre a ASEAN e o Brics é natural e oportuna. A Indonésia já é membro pleno do Brics, enquanto a Malásia e a Tailândia são reconhecidas como parceiras. Nossas metas compartilhadas refletem as esperanças, os desafios e as criações do Sul Global. O surgimento do Brics não é um fenômeno isolado. Ele faz parte de um despertar mais amplo do Sul Global, que está se reafirmando como uma força central nos assuntos internacionais. Esse movimento não tem a ver com a rejeição ao Ocidente. Trata-se justamente de reequilibrar um sistema que há muito favorece apenas alguns poucos selecionados”.
Segundo Datuk Seri Wong Chun Wai, os países da Ásia, da África e da América Latina não querem mais ser receptores passivos de políticas moldadas em outros lugares. “Eles querem ser participantes ativos, moldando um futuro que reflita suas próprias prioridades e realidades. O Sul Global não é uma voz única, mas está cada vez mais unificado em seu apelo e seu clamor por um mundo mais equitativo e inclusivo. A ascensão do Brics e do Sul Global não é uma ameaça, é uma oportunidade de criar um mundo em que o poder seja compartilhado, não concentrado, e que a cooperação seja recíproca, não paternalista, e que o desenvolvimento seja sustentável, não extrativista. O Brics não busca substituir uma hierarquia global por outra”.

Para Martin Jacques, membro sênior da Universidade de Tsinghua e anteriormente da Universidade de Cambridge, o maior desafio do Brics é como representar, respeitar e articular a diversidade do grupo, especialmente quando esses países têm níveis tão diferentes de desenvolvimento. “No centro desse desafio está o objetivo do Brics de manter a sua coesão. O presidente Trump está usando as tarifas para dividir. Por isso, é vital que os Brics permaneçam unificados e coerentes”, disse o acadêmico. No entanto, ele lembrou que desde o fim da Segunda Guerra Mundial, o mundo tem observado uma constante ascensão dos países em desenvolvimento que vai desde os movimentos de libertação nacional na África e na Ásia e na busca deles pelo desenvolvimento. O sucesso do advento do Brics+ culminou com a reação autoritária do governo Trump.
“É impossível ver o fenômeno Trump sem ver o crescimento da China, da Índia e do mundo em desenvolvimento. O governo Trump 2.0 é uma reação a esse crescimento, a esse mundo. É uma tentativa de reassumir a posição hegemônica dos Estados Unidos, dividindo, diminuindo e criando uma disrupção. Os Estados Unidos criaram essa forma de desmantelar e destruir o sistema internacional, recriando o mundo à sua imagem, dando prioridade aos seus próprios interesses, mesmo com prejuízo aos seus aliados como o Japão”. Para ele, o grande valor do Brics+ está em ser uma alternativa a este projeto caótico de Trump.


Por fim, conforme Ali Muhammad Ali, diretor-gerente da Agência de Notícias da Nigéria (NAN), os países do Brics+ não são apenas um grupo de economias emergentes, são uma força que deve ser reconhecida, já que sua influência está crescendo dia a dia também. “Nossa força combinada é imparável. Com novos membros como o Egito, os Emirados Árabes Unidos, o Irã e a Etiópia, que agora entraram, nós cobrimos quase metade da população global. Nosso PIB é de 63,2 trilhões, o que é impressionante, superando os 52 trilhões de dólares do G7. O Fundo Monetário Internacional prevê que a economia mundial vai depender mais dos Brics para impulsionar o crescimento nos próximos cinco anos, com a China, sozinha, contribuindo com 22% do crescimento global. Os países Brics respondem por mais de 40% da produção industrial do mundo. Produzimos 42% do trigo, 52% do arroz, 46% da soja no mundo. Isso é segurança alimentar. A voz dos Brics, portanto, representa uma influência crescente que vai além do Sul Global. Está moldando a governança global, o desenvolvimento econômico e relações internacionais”.
Segundo ele, para a Nigéria, ingressar nos Brics é óbvio. Conforme Ali, o país está estrategicamente posicionado na África. “Nossa parceria com os Brics se baseia em três pilares essenciais. Em primeiro lugar, vemos os Brics como uma opção natural para a Nigéria, considerando nossos objetivos e valores compartilhados. Em segundo lugar, estamos interessados em reduzir nossa dependência do sistema centrado nos Estados Unidos e promover um mundo multipolar. Em terceiro lugar, juntar-se aos Brics nos ajuda a nos posicionar como potência emergente no cenário global. A voz dos Brics é, de fato, alta e clara. Deslumbramos um Sul Global próspero e um mundo mais justo e equitativo”.




